Havia várias versões da “soneca” de Mário Soares quando recebeu um ministro de um país árabe em audiência no Palácio de Belém quando era Presidente da República. Agora o embaixador Alfredo Duarte Costa, antigo assessor para as Relações Internacionais de Mário Soares , explica os pormenores no livro que recentemente lançou “Encontros que a memória guarda” , editado pela Caminho. O iSleep regista a história:
“Mário Soares tinha por hábito reservar após os almoços algum tempo para descansar. Assim acontecia quando era Presidente da República, o que nos levava a nunca agendar uma audiência ou uma reunião para antes das quatro da tarde. No entanto, um dia, devido ao reduzido número de horas que o ministro dos Negócios Estrangeiros de um país árabe permaneceria em Lisboa e às dificuldades da agenda do Presidente, fomos obrigados a marcar a audiência para as quinze horas. Antes do seu início apercebi-me que o Presidente estava cansado e algo contrariado por ter de receber o referido ministro. Este estava acompanhado pelo embaixador do seu país em Lisboa e, após as saudações habituais, iniciou um longo monólogo durante o qual elogiou as virtudes do regime vigente no seu país, por sinal pouco recomendável, referiu o desenvolvimento alcançado e os progressos verificados em todos os domínios , que se deviam, segundo afirmou, aos méritos excepcionais do seu Presidente. Quando Mário Soares percebeu que o ministro estava embalado e que não se calaria tão depressa, fechou os olhos e… adormeceu. Preocupado com a situação, procurei, aliás sem grande êxito, encontrar maneira de interromper aquele solilóquio. Subitamente, Mário Soares abriu os olhos para me perguntar: “Quando é que ele se cala?” Apesar do visitante não compreender português, estou certo de que pela expressão de enfado do Presidente, se apercebeu de que a sua conversa não estava a ser seguida com demasiado interesse”.
in Alfredo Duarte Costa, Encontros que a memória guarda, Editorial Caminho, Lisboa 2017